domingo, 23 de dezembro de 2012

Precedente II

Aliás, transcrevo aqui um artigo feito pelo cientista político Roberto Amaral, na qual o mesmo faz uma severa crítica à postura do Judiciário no Brasil, valendo a pena transcrevê-la:
                                                                   
                                                                   

"O precedente é perigoso, o aplauso é trágico:

                                                                 
A separação de poderes, desde Montesquieu, baseia-se, nas democracias representativas, como a brasileira, em dois pólos de difícil equilíbrio, pois, uma perna é a igualdade quimérica e outra é a assimetria real, derivada da fonte diversa da legitimidade de cada um.
Pelo menos na teoria, esses poderes, para serem iguais e interdependentes (e não independentes) precisam conviver num sistema de pesos e contra-pesos segundo o qual cada um, de per si, limita o arbítrio (e não o poder) do outro. Assim, o Executivo tem seus atos fiscalizados pelo Legislativo, e a legalidade desses atos é controlada pelo Judiciário, que, igualmente, controla a constitucionalidade das leis, cuja elaboração é prerrogativa exclusiva do Poder Legislativo. O Executivo por meio das Medidas Provisórias e o Judiciário brasileiro, principalmente na sua fase atual, rompendo com a formação positivista de nosso Direito, teima em legislar, assumindo poderes que lhe são vedados pela Constituição de que o Judiciário deve ser guardião.
O Judiciário, no Brasil, também foge à regra, por não conhecer controle externo.
Se não conhece a fiscalização a que são obedientes os demais poderes, a quem os atos judiciais estão submetidos? Quem lhe impõe limites? Não se diga que é a Constituição, pois que esta reina sobre todos.
Separando e distinguindo os poderes, e, consequentemente, impondo-lhes limitações, há, ainda e principalmente, a origem de cada um. Ao contrário do Executivo e do Legislativo, o Judiciário, no Brasil, é o único dos poderes republicanos que desconhece a única legitimidade conhecida pela democracia, aquela derivada da soberania popular. Em vez de mandatários da vontade da cidadania, expressa em eleições periódicas das quais derivam mandatos certos, os membros do Judiciário – agora me refiro aos Tribunais superiores, a começar pelo STF –, são nomeados pelo Presidente da República; em vez de exercerem mandatos a termo (como os titulares dos poderes Executivo e Legislativo em todas as instâncias) suas investiduras relembram a monarquia, pois são vitalícias.
Ao contrário de governantes e legisladores, são inalcançáveis, o Judiciário como instituição e os ministros como juízes, livres daquele controle externo que eles próprios exercem sobre o Executivo. São como o rei na monarquia: irresponsáveis, isto é, não respondem pelos seus atos.
Açulado por uma direita impressa inconsequente, vem, de uns tempos até aqui, o TSE e, principalmente, o STF, exorbitando de seus poderes, seja julgando para além da lei, seja criando direito novo, construindo a instabilidade jurídica que afeta a segurança dos cidadãos, pois todo o direito vigente pode ser alterado, de cabo a rabo, numa simples assentada – seja a presunção da inocência nos julgamentos criminais, seja o direito de defesa, institutos que nos separam da barbárie.
Sem discutir o mérito das decisões, o fato é que as recentes sessões da Suprema Corte (refiro-me especificamente à novela do “mensalão”) se transformaram em lamentável reality show, donde a espetacularização do julgamento, cada juiz procurando desempenhar seu papel como ator preocupado com as câmeras e a audiência, embora não recebam cachê nem concorram a prêmios. Louvo a transparência para lamentar o conteúdo.
O juiz isento, sereno, incumbido pela sociedade (pela sociedade?) de, em seu nome, julgar, transfigura-se em promotor raivoso, e raivosos, os julgadores se desentendem. No mesmo diapasão das agressões aos réus, desrespeitados, desrespeitam-se e agridem-se entre si.
O que foi feito da liturgia da função nobilíssima?

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